segunda-feira, 26 de maio de 2008

Alter-ego

¨Eu não escrevo o que quero, escrevo o que sou ¨
- Clarice Lispector

Estava cansada de todos aqueles clichês, mas usava-os.
Não era politicamente correta. Não tinha a consciência tão tranquila quanto aparentava.
Não tinha a alma tão pura.
Vivia um mundo de contradições e não deixava que ninguém conhecesse o seu universo.
Alguém ajudaria? Não. Apenas não iriam compreender. Nem ela compreendia.
Talvez mergulhar no que nem ela mesma compreendia era o que dava vivacidade à sua vida monótona.
Parecia que tudo que acontecia fora do seu universo paralelo não coexistia com o que acontecia dentro.
Era uma mistura de confusas e convulsas personalidades.
Uma era várias.

Luana H.

sábado, 24 de maio de 2008

Simples

Estava tão feliz que parecia que ia explodir.
Uma vontade inexplicável de chorar, rir, de estar longe dali, de estar bem perto.
Vontades que deixaram uma marca deliciosa na alma.

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Que a força do medo que eu tenho,não me impeça de ver o que anseio.
Que a morte de tudo o que acredito não me tape os ouvidos e a boca.
Porque metade de mim é o que eu grito,mas a outra metade é silêncio…
Que a música que eu ouço ao longe,seja linda, ainda que triste…
Que a mulher que eu amo seja para sempre amada mesmo que distante.
Porque metade de mim é partida,mas a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo não sejam ouvidas como precee nem repetidas com fervor,apenas respeitadas,como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos.
Porque metade de mim é o que ouço,mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora se transforme na calma e na paz que eu mereço.
E que essa tensão que me corrói por dentro seja um dia recompensada.
Porque metade de mim é o que eu penso,mas a outra metade é um vulcão.
Que o medo da solidão se afaste e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto,um doce sorriso,que me lembro ter dado na infância.
Porque metade de mim é a lembrança do que fui,a outra metade eu não sei.
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria para me fazer aquietar o espírito.
E que o teu silêncio me fale cada vez mais.
Porque metade de mim é abrigo, mas a outra metade é cansaço.
Que a arte nos aponte uma resposta,mesmo que ela não saiba.
E que ninguém a tente complicar porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer.
Porque metade de mim é platéia e a outra metade é canção.
E que a minha loucura seja perdoada.
Porque metade de mim é amor,e a outra metade…também

Ferreira Gullar

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Metade

''Porque metade de mim é a lembrança do que fui,a outra metade eu não sei.''
Ferreira Gullar

As lembranças da infância pareciam ter desaparecido. Ou haviam se misturado com as do dia de ontem, não sabia direito.
Nada mais era certo.
Todas as suas certezas de criança haviam ruído.
Sentia-se perdida diante de cobranças, situações, pessoas, poemas...
Chão? Não tinha mais.
Virou uma personagem desse mundo. Reinventou-se.

terça-feira, 20 de maio de 2008

Essencial

''Tem bola de capotão, capitão capture essa menina
tem saudade e saudação
tem uma parte que não tinha... parte que não tinha... parte que não tinha...''
Teatro Mágico

Faltava um pedaço dela.
Não era de um braço. Nem mesmo um pedaço do seu coração.
Faltava, mas não sabia onde.
Procurou nas sensações, nos sentimentos, nos desejos, mas a falta ainda incomodava.
Não doía, incomodava.
Mesmo sem um pedaço, continuava sua vida de boneca burguesa. Dormia, ia à escola, andava nas ruas.
Teve idéias maravilhosas para reencontrar sua parte perdida. Todas em vão.
A angústia silenciosa dava à nossa burguesa um ar triste.
Tristeza que tomou conta dela. Não, não pense que era uma tristeza ruim. Era uma tristeza doce. Uma melancolia suave.
Fechou-se. Não sentia o mundo. Sentia apenas o que estava dentro dela. Durante meses saboreou uma longa metamorfose.
Encontrou, dentro de si, seu pedaço de alma perdida.

Luana H.

domingo, 18 de maio de 2008

Magnificência

''E porque você tem um rosto que está sempre um nicho, mesmo quando põe o cabelo para cima, parecendo uma santa moderna, e anda lento, e fala em 33 rotações mas sem ficar chata. E porque você é uma menina com uma flor, eu lhe predigo muitos anos de felicidade, pelo menos até eu ficar velho: mas só quando eu der uma paradinha marota para olhar para trás, aí você pode se mandar, eu compreendo. ''
Vinícius de Moraes


Fitava com aquele olhar inocente. Aquele olhar vivo e vital. Sentia-se com os pensamentos a mostra.
O cabelo preso no alto da cabeça dava graça ao rosto pálido. Os cabelos, longos e pesados, combinavam com os olhos tristes.
A candura de criança transbordava pela pele. Era dona de gestos angelicais.
Não era bonita. Tinha olhos tristes, formas infantis, inocência na voz. Mas tinha um brilho...incandescente!

Luana H.

sábado, 17 de maio de 2008

Breve

''- Por que é que você me pede tanta aspirina? Não estou reclamando, embora isso custe dinheiro.
- É para eu não me doer.
- Como é que é? Hein? Você se dói?
- Eu me dôo o tempo todo.
- Aonde?
- Dentro, não sei explicar.
Aliás, cada vez mais ela não se sabia explicar.''
Clarice Lispector

Os sentimentos borbulhavam dentro dela como água no fogo. Somente os sentimentos, os desejos estavam adormecidos há muito.
Pensar na solidão, no sofrimento que não existia, no drama que ela própria criara, não a aborrecia mais. Aprendera a lidar com suas outras personalidades. Não doía mais.
Talvez houvesse compreendido o sentido da sua existência. Compreendia, porém não explicava.
Lembranças? Ficaram algumas poucas. Somente as necessárias.
A vida começara naquele instante e terminara ali também, para nascer e morrer no instante seguinte.

Luana H.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Existencialismo vermelho.

“Dá-me a tua mão. Porque não sei mais do que estou falando. Acho que inventei tudo, nada disso existiu! Mas se inventei o que ontem me aconteceu - quem me garante que também não inventei toda a minha vida anterior a ontem? Dá-me a tua mão…”
Clarice Lispector

Nasceu, cresceu e aprendeu tudo aquilo que queriam que ela aprendesse. Mas um belo dia se deparou com uma realidade confusa: EXISTIA!
Ocupava espaço, se movimentava, sentia dor, felicidade, angústia, solidão...
Até descobrir-se gente, todos esses atos e sentimentos eram perfeitamente aceitáveis.
Por vezes, desconfiava viver em um mundo diferente. Um mundo que não era seu.
Sentia que a sua velha alma de adolescente tinha recebido uma mente que não lhe pertencia e que estava aprendendo a conhece-la.
Pensava muito - Existia sentido pra vida? Existia felicidade? O que vinha depois? O que vinha depois de tudo? Já pensou no absurdo que é ser você?
Suas questões eram tão grandes que transbordavam. Queimavam.

Luana H.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Começo de um mundo exposto

''Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero uma verdade inventada.'' Clarice Lispector


[in]definição
Gostava das coisas efêmeras. Seu prazer se dava na cor do sol refletido no mar. Uma brisa doce emocionava-lhe.Gostava de aprisionar esses momentos em si, só para saboreá-los lentamente.
Vivia movida por sensações, não por desejos. Não desejava nada, apenas saboreava com doçura toda a essência, ácida e dolorida, da vida.
Por vezes, buscava um sentido que não existia, assim como as respostas que só seu coração conhecia.
Ás vezes doía ter um mundo inteiro dentro de si, com fadas, bruxas, mocinhas e meretrizes. Todas girando e tentando escrever uma só história. A sensação era de que tudo aquilo não ia caber dentro dela.
O grito, por mais alto e intenso que fosse, não atingia a intensidade que a sua alma precisava. O grito machucava o peito e lhe rasgava a alma por inteiro. Doía. Sufocava.

Luh Helena